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Sobre Mim:

Anderson, nascido em 17 de agosto de 1996 (17 anos), concluiu o Ensino Médio em 2012 e, até então, dedica o tempo ao vestibular - antes, para o curso de direito. É bem caseiro. Por natureza, carioca. Por acaso, blogueiro. Futuramente, estudante de Letras: Português-Literaturas. Talvez, dependendo das mudanças que o tempo proporciona, futuro professor de Língua portuguesa, Literatura e Redação. Como passatempo, escreve. Por amor, viciado em filmes e em livros. Gosta bastante da área de epistemologia, do existencialismo, de epifanias e tem como escritor/escritora preferida a Clarice Lispector.

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"Entender é sempre limitado. Mas não entender pode não ter fronteiras" (Clarice Lispector)

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"A missanga, todos a vêem. Ninguém nota o fio que, em colar vistoso, vai compondo as missangas. Também assim é a voz do poeta: um fio de silêncio costurando o tempo" (Mia Couto)

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"Quanto a mim, só sou verdadeiro quando estou sozinho"

(Clarice Lispector)
"Não sou alegre nem sou triste: sou poeta." (Cecília Meireles)
terça-feira, 24 de dezembro de 2013


   Jamais esquecerei o meu aflitivo e dramático contato com a eternidade.

   Quando eu era muito pequena ainda não tinha provado chicles e mesmo em Recife falava-se pouco deles. Eu nem sabia bem de que espécie de bala ou bombom se tratava. Mesmo o dinheiro que eu tinha não dava para comprar: com o mesmo dinheiro eu lucraria não sei quantas balas.

   Afinal minha irmã juntou dinheiro, comprou e ao sairmos de casa para a escola me explicou:

- Como não acaba? - Parei um instante na rua, perplexa.

- Não acaba nunca, e pronto.

- Eu estava boba: parecia-me ter sido transportada para o reino de histórias de príncipes e fadas. Peguei a pequena pastilha cor-de-rosa que representava o elixir do longo prazer. Examinei-a, quase não podia acreditar no milagre. Eu que, como outras crianças, às vezes tirava da boca uma bala ainda inteira, para chupar depois, só para fazê-la durar mais. E eis-me com aquela coisa cor-de-rosa, de aparência tão inocente, tornando possível o mundo impossível do qual já começara a me dar conta.

- Com delicadeza, terminei afinal pondo o chicle na boca.

- E agora que é que eu faço? - Perguntei para não errar no ritual que certamente deverira haver.

- Agora chupe o chicle para ir gostando do docinho dele, e só depois que passar o gosto você começa a mastigar. E aí mastiga a vida inteira. A menos que você perca, eu já perdi vários.

- Perder a eternidade? Nunca.

   O adocicado do chicle era bonzinho, não podia dizer que era ótimo. E, ainda perplexa, encaminhávamo-nos para a escola.

- Acabou-se o docinho. E agora?

- Agora mastigue para sempre.

   Assustei-me, não saberia dizer por quê. Comecei a mastigar e em breve tinha na boca aquele puxa-puxa cinzento de borracha que não tinha gosto de nada. Mastigava, mastigava. Mas me sentia contrafeita. Na verdade eu não estava gostando do gosto. E a vantagem de ser bala eterna me enchia de uma espécie de medo, como se tem diante da ideia de eternidade ou de infinito.

   Eu não quis confessar que não estava à altura da eternidade. Que só me dava aflição. Enquanto isso, eu mastigava obedientemente, sem parar.

   Até que não suportei mais, e, atravessando o portão da escola, dei um jeito de o chicle mastigado cair no chão de areia.

- Olha só o que me aconteceu! - Disse eu em fingidos espanto e tristeza. - Agora não posso mastigar mais! A bala acabou!

- Já lhe disse - repetiu minha irmã - que ela não acaba nunca. Mas a gente às vezes perde. Até de noite a gente pode ir mastigando, mas para não engolir no sono a gente prega o chicle na cama. Não fique triste, um dia lhe dou outro, e esse você não perderá.

   Eu estava envergonhada diante da bondade de minha irmã, envergonhada da mentira que pregara dizendo que o chicle caíra na boca por acaso.

   Mas aliviada. Sem o peso da eternidade sobre mim.


(Clarice Lispector)









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